quinta-feira, 28 de março de 2013

O menino magrinho

Durante toda aquela semana meu amigo me preocupava, estava agindo estranhamente e a todo momento parecia se assustar com algo, como se estivesse com um problema que o ocupava toda a mente ou algo que lhe perturbasse intensamente. Logo pela segunda notei que algo não estava normal e achei melhor deixa-lo, talvez fosse algo momentâneo, em algumas horas ele deveria estar melhor e voltaria a fazer suas velhas brincadeiras, como todo dia.
O dia terminou, veio a terça e já esperava encontra-lo normalmente, quando me deparo com alguém ainda mais tenso e perplexo, o problema estava começando a ficar sério, pensei que podia ser algum distúrbio psicológico, mas ele foi sempre tão equilibrado... pensei então que talvez fosse alguma medicação, porém não devia estar doente e se estivesse haveria de ter me avisado, só restava uma explicação, meu pobre amigo estava em uma cilada grande: havia se tornado um dependente químico, era isto, o bendito mundo das drogas havia o fisgado, era a única explicação racional! 
Mais do que nunca ele precisava da minha ajuda e eu não poderia deixa-lo na mão, tratei de organizar meus pensamentos e tentar falar calmamente com ele sobre o que estava se passando. Cerquei ele no corredor do  prédio do serviço, sua aparência era assustadora, seus olhos pareciam saltar as pálpebras, como uma presa assustada preste a ser devorada e então o disse:
_ O que está aconteceu, meu amigo Zé?
Ele olhou para os lados, como se fosse me dizer algo extremamente sigiloso, me segurou nos ombros, parou por alguns segundos e ficou me olhando com aqueles olhos estatelados e depois me empurrou e saiu andando apressadamente enquanto resmungava:
_Nada, nada... 
Definitivamente aquilo não era nada, algo muito ruim estava acontecendo e cada vez mais eu temia que minhas teorias estivessem certas. 
Chegou então a quarta, precisa resolver aquilo de uma vez por todas, mas quando cheguei ao escritório, mais tarde que de costume, pois antes havia passado em uma clínica para obter algumas informações, encontrei um alvoroço de pessoas apavoradas, conversando desorganizadamente sobre algum assunto comum a todos. Procurei rapidamente por Zé e como temia não o vi, logo pensei que algo mais grave havia acontecido e ligeiramente me aproximei do grupo e perguntei o que estava acontecendo, o rapaz do café se dispôs a falar e me explicou:
_É o Zé, ele esta por ai perguntando pra todos que ele encontra se estão vendo um certo menino... só que o tal menino não existe e o comportamento do Zé já não estava dos melhores. 
_É o que eu temia, não vejo outra escolha, amanhã teremos que ajuda-lo, seja por bem ou por mal!
Meu velho amigo Zé estava tendo fortes alucinações, não via outra escolha se não interna-lo até que ele melhorasse, falei com sua família que também estava completamente em pânico e combinamos todo o esquema para o dia seguinte. 
No outro dia cheguei no escritório logo cedo, todos estava avisados, a ambulância e os enfermeiros deviam chegar por volta das nove horas, eram sete e meia e o Zé devia chegar as oito, e foi tudo conforme o script, as oito meu amigo apareceu, mais aflito e agitado do que nunca, andando para todos os lados, virando o pescoço a todo instante, observando tudo e todos com pânico, pobre amigo, devia estar tendo as alucinações. As nove horas os enfermeiros chegaram e entraram no prédio com todos os equipamentos para levarem o paciente, todos trataram de encaminhá-los até a sala em que estava Zé sentado a um canto, rebatendo-se e fazendo qualquer som não identificável com a boca, tratei de ajudá-los, afinal era meu melhor amigo e queria vê-lo bem novamente, os dois enfermeiros o levantaram sem muita dificuldade ele não reagiu muito, sabia que precisava de ajuda, e antes que o colocasse em uma camisa de força ele disse que ninguém lhe dava ouvidos e pediu-me que respondesse uma única pergunta, nada mais justo:
_Diga Zé, pode falar.
_Você está vendo ali naquele canto, com os olhos lacrimejando, a boca seca, a pele marcada de cicatrizes profundas, olhando diretamente para nós, um menino magrinho?
_Não meu amigo, não estou...
E imediatamente Zé se renovou, o apavoramento passou, seus olhos voltaram ao lugar, seu corpo parou de tremer e como em um ato de completo alívio me disse:
_ Ufa, ainda bem! Pensei que fosse só eu que não o via. 

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